Saber que se tem TDAH pode ser como acender a luz num quarto onde você viveu tropeçando no escuro. Mas chegar até esse diagnóstico não é tão simples quanto preencher um teste online ou se identificar com um meme. O processo diagnóstico do Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é sério, criterioso, multidimensional — e feito por profissionais especializados.
Se você suspeita que possa ter TDAH (ou acompanha alguém que tem), este artigo vai te ajudar a entender como é feita essa avaliação, o que ela envolve e por que ela pode mudar vidas.
O que leva uma pessoa a buscar diagnóstico?
Na maioria das vezes, o caminho até o diagnóstico começa com sintomas recorrentes que interferem significativamente na vida:
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Dificuldade constante em se organizar
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Esquecimento de tarefas e compromissos
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Atrasos frequentes
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Impulsividade verbal ou emocional
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Sensação de estar sempre “bagunçado por dentro”
Esses sintomas podem aparecer desde a infância, mas nem sempre são reconhecidos — especialmente em mulheres, adultos e pessoas que criaram “máscaras” para compensar suas dificuldades.
Os primeiros passos: quando acender o alerta?
A recomendação dos especialistas é buscar ajuda quando os sintomas forem:
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Persistentes (há mais de 6 meses)
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Presentes em mais de um ambiente (casa, trabalho, escola, etc.)
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Intensos o suficiente para causar prejuízos funcionais (relacionamentos, carreira, estudos)
Ou seja: todo mundo pode esquecer uma tarefa ou perder o foco às vezes. O TDAH se caracteriza pela frequência, intensidade e impacto desses comportamentos.
Critérios diagnósticos do DSM-5
O diagnóstico oficial de TDAH é feito com base nos critérios do DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais), usado por profissionais no mundo todo.
Segundo o DSM-5, é necessário que:
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Os sintomas estejam presentes desde antes dos 12 anos
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Os sinais apareçam em dois ou mais contextos distintos (por exemplo, casa e escola)
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Os sintomas causem impacto significativo na vida acadêmica, profissional ou social
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As manifestações não sejam melhor explicadas por outro transtorno (como ansiedade, depressão, TEA, etc.)
Além disso, os sintomas são organizados em três categorias:
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Desatenção
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Hiperatividade
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Impulsividade
Cada uma com subitens específicos. É com base nesse mapeamento que se identifica o tipo de TDAH: desatento, hiperativo-impulsivo ou combinado.
Quem pode diagnosticar TDAH?
O diagnóstico deve ser feito por um profissional de saúde mental capacitado, como:
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Psiquiatra
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Psicólogo clínico
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Neuropsicólogo
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Neurologista (em alguns casos específicos)
Cada profissional pode atuar de forma complementar. Por exemplo, um psicólogo pode aplicar testes e realizar entrevistas, enquanto o psiquiatra pode conduzir o diagnóstico e indicar medicação, se necessário.
Avaliação multidimensional: como funciona?
Diferente do que muitos pensam, não existe exame de sangue, tomografia ou teste único que confirme o TDAH. A avaliação é ampla e inclui diversas etapas:
🗣️ 1. Entrevistas clínicas
Conversas aprofundadas com o paciente (e, no caso de crianças, também com os pais) ajudam o profissional a entender:
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História de vida e escolar
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Padrões comportamentais
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Relação com rotina, impulsos e foco
📋 2. Questionários e escalas padronizadas
Ferramentas como:
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SNAP-IV
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Vanderbilt Assessment Scale
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Conners Rating Scale
Esses instrumentos são respondidos por pais, professores e/ou pelo próprio paciente, e ajudam a medir a frequência e intensidade dos sintomas de forma mais objetiva.
📚 3. Revisão de histórico médico e educacional
Análises de boletins escolares, registros médicos e relatos de desempenho ajudam a montar um panorama desde a infância — essencial para validar os critérios do DSM-5.
🧠 4. Exames físicos e neurológicos (quando necessário)
Embora não exista “exame de TDAH”, exames clínicos podem ser realizados para descartar outras condições médicas ou neurológicas que imitam os sintomas do transtorno, como distúrbios do sono, problemas de tireoide, etc.
O papel da família e da escola no diagnóstico
No caso de crianças e adolescentes, a participação ativa da família e da escola é fundamental. Os professores podem oferecer observações valiosas sobre:
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Comportamento em sala de aula
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Nível de atenção comparado a colegas
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Interações sociais e desempenho acadêmico
Já os pais são importantes para relatar:
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Rotina em casa
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Comportamentos desde os primeiros anos
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Reações emocionais e sociais
Essa visão em múltiplos contextos é exigida pelo próprio DSM-5 para fechar o diagnóstico com segurança.
TDAH em adultos: um diagnóstico que muitas vezes chega tarde
Muitos adultos descobrem que têm TDAH após uma crise de burnout, divórcio, dificuldades no trabalho ou diagnóstico de um filho. A partir daí, percebem que conviveram com sintomas por décadas — apenas sem nomeá-los.
Em adultos, os sinais mais comuns incluem:
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Desorganização crônica
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Procrastinação paralisante
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Sensação de “vida atrasada”
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Impulsividade verbal e emocional
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Dificuldade em manter relacionamentos ou rotinas
O desafio aqui é que os sintomas podem ser confundidos com ansiedade, depressão ou apenas “estresse”. Por isso, o olhar clínico treinado é essencial para fazer uma avaliação cuidadosa e responsável.
Diagnóstico não é rótulo: é ferramenta de libertação
Muitas pessoas têm medo de serem diagnosticadas com TDAH por acharem que isso significa “serem problemáticas” ou “terem um defeito”. Mas o diagnóstico, na verdade, é o início de um caminho de autocompreensão e empoderamento.
Saber o que se tem permite:
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Escolher o tratamento adequado
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Criar estratégias realistas para organização e rotina
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Reduzir a culpa
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Melhorar a autoestima
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Construir uma rede de apoio mais eficiente
Conclusão
Receber o diagnóstico de TDAH não muda o que você viveu — mas muda a forma como você vai viver daqui pra frente.
O processo pode ser longo, envolver múltiplos profissionais e parecer complicado, mas ele é essencial para dar nome, contexto e direção aos desafios diários que tantas pessoas enfrentam sem entender por quê.
Se você sente que os sintomas do TDAH fazem parte da sua história, não hesite em buscar ajuda. E lembre-se: aqui no De Olho no Foco, você sempre encontra um espaço seguro, com conteúdo claro, humano e acolhedor.